29.12.06

COISAS DE FIM DE ANO

A linha do horizonte
Só costura futuro
Sempre presente nos olhos
Nunca ao alcance das mãos

[Aveia Poética 13]

20.12.06

A VIDA PASSA

A vida passa
Lava, cozinha e arruma a casa
E a criatura fica toda engomada
Com cheiro de lavanderia
Vendo morrer mais um dia
Tirando guarda na sacada

A vida varre
Rega e junta o cocô do cachorro
E a pessoa se finge de morta
E molha as três mil violetas
Esperando feito numa opereta
Alguma sombra embaixo da porta

A vida lustra
Tira o pó e passa cera
E a mulher se olha no chão
E seu retrato é transparente
Ela mesma já se vê ausente
Da sua própria solidão

[Aveia Poética 18]

18.12.06

PONTU:AÇÃO

Nesse ponto
Da vida
Ponho
Uma vírgula
Mas sem
Reticências
Apago
De pronto
Logo já mudo
E coloco
Dois pontos


[Aveia Poética 09]

13.12.06

DE PRIMA

Já passa das cinco da tarde
E eu perdendo meu dia
Tentando fazer um poema
Sem olhar pela janela
Sem notar que a primavera
Já toma conta lá fora
E zomba da minha agonia
Escrevendo naturalmente
Um trimestre de poesia

[Aveia Poética 07]

4.12.06

PELO MUNDO

Eu ando pelo mundo
Nesta parte Bom Fim Rio Branco
Deste pequeno Porto Alegre mundo.
Eu ando olhando as caras,
Ouvindo pedaços das falas,
Pesquisando as janelas,
Principalmente dos térreos,
Onde a lógica dura dos velhos
Empilha paredes de coisas.
Eu ando no fim da tarde
De um domingo de garoa fria
Pisando nas flores caídas
Grudadas na calçada molhada
Calçada escorregadia
Que testa a minha perícia
Na luz escassa do fim do dia.
Eu ando e desvio dos carros
E dos loucos dentro dos carros
Ando e desvio dos cachorros
E dos donos dos cachorros
Vendo as lâmpadas que se ascendem
Como pontas de cigarro
Queimando o mercúrio caro
Na frente de uns poucos bares.
E assim nesse mundo eu ando
Pensando que ele me veja assim,
Sozinho, reinventado passos,
E esperando que num cochilo
Num instante de vacilo
O mundo é que ande em mim

[Aveia Poética 11]