10.8.10

LINHA 33

Todo mal
É passageiro
Todo bem
É tripulante
Todo trajeto
É errante
E todo destino,
É letreiro...
Todo embarque
É enchente
Toda saída
É vazante
Todo sentido
É itinerante
E todo encontro,
Ligeiro...
Toda alvorada
É dormente
Todo o horário
É maçante
Toda música
É calmante
E toda catraca,
Dinheiro...
Todo relógio
É certeiro
Todo atraso
É irritante
Todo trabalho
É roteiro
E toda paisagem,
Passante...
Todo barulho
É constante
Todo sinal
É vermelho
Todo inverno
É nevoeiro
E toda parada,
Distante...

Janela
Janela
Cinema de cativo
A vida passa
A vida passa
Passadiço coletivo


9.8.10

URBI

As pessoas lentas
E as apressadas
Lotam as esquinas
E enchem as calçadas
O que era passeio
Agora é trabalho
Ambulante
Informal
Mal necessário
A cidade junta
E desmonta
Na dialética do concreto
Que tenta compor a alma
Com muitas pessoas nervosas
E outras mais calmas
Urbi

Urbana
Urbanidade
(da pedra...
Lascada,
É verdade!)

2.8.10

E EU E VOCÊ?

O crepúsculo
Lustra o lusco
Lustra o fusco
Tudo posto
Tudo justo
Feito mesmo
Prá noite ser

E eu e você?

Somos muito
Um pouco disto
Esta síntese
Anti bússola
Astrolábio
Extra sístole
Feito espreita
Prá manhã ser

E eu e você?

Tiramos futuro
Do escuro
E sopramos o núcleo
De estrelas
Encorpando
Nossa rotação
Pelo céu arquejado
Da noite

Tudo em você me importa
Mesmo no minuto seguinte
Mesmo no mundo lá fora
Tudo em você me reforça

SUB MEMORABÍLIA

Um olhar pela memória
Corre como
Fio de lã desgarrado
Um pedaço de papel no vento
Um esforço extraordinário
Quase uma desistência

Ter foco e prioridade
Nunca foi minha virtude
Muito menos minha vontade
Eu olho rápido por todo lado
E como sempre enxerguei pouco
Sigo pela intuição do panorama
Talvez um desejo de totalidade

Minha época e circunstâncias
São confusas, inconstantes e difusas.
Desde cedo, muito antes,
Quando o mundo era quase apenas
A periferia de uma cidade extrema
De um país sem importância

Só que a ânsia
A época e as circunstâncias
Nunca dão espaço ao tempo
E ajudaram o pensamento
A querer velocidade
Esse olhar da totalidade
E, ao mesmo tempo,
Da distância

Ver a arte em toda a cidade
A rebelião contra a autoridade
Todas as revoluções sonhadas
Possíveis, impossíveis e imaginadas...
Era a ética feita matéria
A paixão toda escancarada...
As ruas, a música,
As mulheres impressionantes
A falta de grana constante
O soviete da zona norte...
(E quem liga pra zona norte?
Quem liga pro que somos e pensamos?...
Mas até que alguma coisa fizemos
E, mal e porcamente,
Eu estava presente...)

Um pedaço de fio
Uma manobra de papel no ar...
Cada vez mais
O futuro pode sempre
Ser menor que o passado
Mas nunca levamos isso a sério
Nem o passado é sério
Na velocidade inquieta
Da criação constante
- Ou, ao menos, insistente –

“Nada se amarra no ar”
O passado
É para quando der tempo
O futuro
Se vê depois
O que às vezes amarra
E conduz o vento

Ou tenta algum sopramento
É mesmo a ética

Feita matéria...